Regulamentar uma polícia ou extensão de outra?
Percebe-se que a
expressão polícia administrativa continua a se opor a polícia
judiciária, sem, no entanto, estarem claros os limites de uma ou de
outra. Certamente, a classificação dos agentes penitenciários, em uma ou
outra polícia, tem suas dificuldades. Certo é que eles integram a
última fase da persecução penal. Porém, a lei de execução penal, por uma
questão de opção legislativa, não está inserida no corpo do Código de
Processo Penal, ao contrário da execução civil. Porém, esse detalhe,
parece-nos pouco relevante.
Mais
relevante é o fato de os agentes penitenciários estarem relacionados à
aplicação da pena, razão pelo qual proponho que essa polícia se denomine
“Polícia Penal”. Com isso, evita-se a associação com a denominação da
uma das espécies de unidade prisional, bem como estaria compatível com a
fiscalização do cumprimento da pena em casos de liberdade condicional e
de penas alternativas.
Nesse
ponto, necessário se faz uma observação sobre as críticas da Pastoral
Carcerária. O conceito de polícia usado diz respeito apenas aos agentes
que exercem suas funções com o uso de armas. Razão pelo qual aceitam
essa denominação apenas para os agentes responsáveis pelo isolamento dos
internos, ou seja, para aqueles com função de vigiar as muralhas
impedindo a fuga, bem como protegendo integridade física dos internos em
relação a inimigos externos. Porém, a atividade desenvolvida por
aqueles que devem controlar a disciplina interna também é atividade de
polícia judiciária, nos termos do conceito do saudoso Hely Lopes
Meirelles. Nesse ponto, mais uma vez foi feliz a participação do Cel.
Amauri Meireles ao afirmar que o uso ou não de armas, com poderes letais
ou não, é questão a se decidir no caso concreto, por quem tem poderes
para usar a força. É o que acontece hoje, por exemplo, no Distrito
Federal em que o agente penitenciário é policial. A autorização do uso de armas, também, pelos agentes penitenciários federais não implica em uso dessas armas internamente.
As críticas
do Sr. Antônio Carlos Biscaia são contrárias à constitucionalização de
mais uma polícia, pois defende o processo inverso, ou seja, a
desconstitucionalização das existentes. Parece-nos que o procedimento
defendido é de mais difícil execução. Primeiro, pela necessidade de
diretrizes nacionais, cujo melhor veículo é a Constituição. Segundo,
porque a quase totalidade do sistema de segurança pública está
constitucionalizada, razão pelo quais as lacunas devem ser supridas
nesse documento. Há
quem afirme que a enumeração das polícias é taxativa, sendo
inconstitucional a criação de outras por lei infraconstitucional.
Reforça esse entendimento a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI
236-8/RJ. Desta forma, seriam inconstitucionais as leis que criaram
polícias prisionais, quer tenham o nome de guardas prisionais ou de
agentes penitenciários, caso tenham dado-lhes poderes de fiscalização ou
escolta extramuros. Correto estaria o procedimento da Polícia
Civil do Distrito Federal que encampou essa atividade, como uma extensão
da atividade de polícia judiciária.
Cabe
mencionar que em razão de constituirmos uma federação, a proposta do
Movimento Nacional de Direitos Humanos de polícia única e
desmilitarizada constitui praticamente uma utopia.
Ainda a
respeito do regramento constitucional, cabe lembrar que as polícias
administrativas estão disciplinadas por normas infraconstitucionais, com
exceção das polícias estaduais militares, Polícia Rodoviária e Polícia
Ferroviária federal. Mas as polícias judiciárias — polícias estaduais
civis e Polícia Federal — têm suas atribuições delineadas na
Constituição. Por essa razão, os agentes penitenciários, cujas
atividades estão associadas à execução penal, ou seja, a uma das fases
da execução penal, devem também ter suas atribuições delineadas na
Constituição, com recepção das normas da Lei de Execução Penal, pois não
há incompatibilidade entre a Proposta de Emenda Constitucional em
testilha e essa lei, como pode se observar.
O Sr.
Maurício Kuehne do DEPEN manifestou-se contrário à proposta,
alegando que há na Lei de Execução Penal, uma série de disposições que
se referem à formação do pessoal penitenciário que ainda não foram
colocadas em prática, tais como, a formação de um quadro de pessoal no
mais lato sentido, compreendendo agentes penitenciários, pessoal
administrativo e pessoal técnico. Disse que não poderia concordar em se
mudar alguma coisa que sequer foi testada.
Deu-nos
notícia de opinião contrária do Diretor do Sistema Penitenciário
Federal, Wilson Sales Damazio, dos quais transcrevemos, em seguida,
parte da conclusão. III. O modelo pensado para o Sistema Penitenciário
Federal, e que hoje está sob análise, comporta a existência de duas
categorias profissionais, ou seja, o agente penitenciário responsável
pela segurança, escolta, custódia e guarda dos presos, e o especialista
em gestão e tratamento penitenciário, profissional responsável pelo
suporte administrativo, pela assistência e ressocialização de pessoas
recolhidas a penitenciárias. Tal modelo comporta, perfeitamente, as
ações dos servidores do Sistema Penitenciário Federal no tocante à
segurança e ao tratamento, sendo certo que, apesar de terem perfis um
pouco diferentes, as duas categorias profissionais trabalharão em
harmonia visando ao atendimento dos desideratos da execução penal. IV. A
proposta sob análise representa o anseio de uma parcela considerável
daqueles que operam a execução penal naquilo que se refere à segurança
dos estabelecimentos. Representa ainda a vontade dos comandantes gerais
de polícias e dos chefes de polícia, os quais aspiram a que suas
polícias, militar e civil, desempenham suas funções longe das muralhas,
escoltas, segurança dos presídios e dos agentes penitenciários. V. A
criação da Polícia Penitenciária Estadual e Federal, com as atribuições
previstas no projeto que se assemelha ao que existe nos Estados Unidos
da América, a nível federal, ou seja, ao U.S. Marshals Service, uma
polícia responsável pelas ações perigosas e delicadas, acesso ao sistema
penitenciário, quais sejam: escoltas de presos dentro e fora dos
Estados-membros, cumprimento das ordens de captura aos foragidos das
penitenciárias, interface com a Polícia Judiciária na prevenção e
repressão aos crimes relacionados com a execução penal e aos sistemas
carcerários; VI. A criação dessas novas categorias funcionais, com a
conseqüente transformação ou não dos agentes penitenciários em
policiais, traria mais efetividade e segurança aos trabalhos
relacionados com o lado operacional das penitenciárias, sendo fator
preponderante para a proteção de uma categoria que hoje está à mercê da
sanha avassaladora dos líderes de facções e de comandos criminosos, fato
esse observado, em maio passado, em São Paulo, e em dezembro, no Rio de
Janeiro, esses dois casos, com maior intensidade e repercussão, mas que
é comum em todo o País.
Sr. Antônio Carlos Biscaia trata a matéria como questão de segurança
pública, em sentido amplo, integrado pelas instituições que integram o
quadro de segurança pública: polícias federal e estadual (civis e
militares), e pelas instituições da persecução penal, Ministério
Público, Poder Judiciário e, na ponta do sistema, os agentes da execução
penal. No
entanto, entende que essa PEC não vai alterar o sistema penitenciário.
Exemplifica com a menção constitucional à Polícia Ferroviária Federal,
mas que nunca foi efetivada. Bem como a iniciativa da Polícia Portuária
Federal, que tem o mesmo pleito. Diz que, no Primeiro Programa de
Segurança Pública, defendeu a desconstitucionalização das polícias, com
os efeitos seguintes. Reforça o sistema federativo, propicia aos estados
adaptar o sistema a suas peculiaridades com criação de polícia de
ciclos completos: investigação e repressão. Entende que o aprimoramento
das instituições policiais não implica em alteração constitucional, a
exemplo do novo programa nacional de segurança pública: segurança com
cidadania. Deixa claro que tem conhecimento da dificuldade dos agentes
penitenciários, cujos salários são, em regra, irrisórios. Defende
melhoria das condições de trabalho, da escala de serviços e das
condições salariais dos agentes penitenciários. Por fim dá notícia de
que posicionamento do Ministério da Justiça é contrário à PEC, pelos
motivos por eles apontados, entre outros.
O Sr. Bruno
Azevedo vê com simpatia a proposta, alegando que
a desconstitucionalização retira as diretrizes da União, com vista a uma
padronização. Diz ser oportuna porque completa o sistema da persecução
penal com essa área especializada. Lembra que essa atividade é
considerada a segunda mais arriscada. E responde a pergunta formulada
pelo Sr. Antônio Carlos Biscaia de qual seria a contribuição, dizendo
que seria a criação de um corpo específico. Com a criação desse corpo
específico, seria mais fácil a elaboração de políticas de aprimoramento.
Diz que a Polícia Ferroviária Federal não foi criada devido à opção do
país pelas rodovias. Reitera que os agentes penitenciários estão na
ponta do sistema, uma vez que trabalham com a contenção, custódia e
vigilância.
Fonte: PARECER DA COMISSÃO ESPECIAL DA PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO N.º 308-A, DE 2004, DO SENHOR NEUTON LIMA, QUE “ALTERA OS ARTS. 21, 32 E 144, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CRIANDO AS POLÍCIAS PENITENCIÁRIAS FEDERAL E ESTADUAIS” – PEC 308-A/2004.
FONTE: http://agepen-ac.blogspot.com.br